sábado, 31 de agosto de 2013

O Assassino do Opala - cap 7


Charles voltou a olhar para frente e a tentar, inutilmente, se afastar do sujeito que se aproximava. Desistiu quando percebeu que o homem já estava bem atrás dele.
O Assassino do Opala estava parado de pé logo atrás do professor...


Último Capítulo

– “Boa noite, professor” – disse o sujeito de pé. 

A voz lhe era familiar. Charles se virou e viu o rosto do assassino.

– “Sargento Bernardi?”.

Bernardi, fardado, segurando a pá em sua mão esquerda, olhava friamente para Charles Mendez.

– “Parece surpreso, professor!”.  

Charles voltou o olhar para a pá suja de sangue. Concluiu que era o instrumento usado para decapitar. 

Bernardi continuou:

“O professor ficou tão assustado com a minha brincadeira! Foi muito divertido assustá-lo! Lembra-se dos corpos decapitados, não lembra? As cabeças estão enfileiradas nas minhas prateleiras. Como lhe disse na delegacia: é preciso ter uma boa cabeça para ser um físico, não é, professor Mendez?” – Bernardi segurou a pá com ambas as mãos. “Sua cabeça vai ter um lugar especial na coleção!”.  

– “Espere!” – Charles disse, fazendo com que Bernardi se detivesse. 
– “Antes você precisa me contar! Preciso saber! Você não é o assassino original! Por que você quer tomar o lugar dele?” – por suas pesquisas com jornais antigos, Charles imaginava que teriam existido três diferentes assassinos do opala, usando o mesmo carro – Estava certo.

Bernardi riu – “O carro! O carro é o assassino! Nós só damos o que ele quer! Eu me lembro bem do dia em que o vi na garagem de carros apreendidos! Não era apenas um carro! Não! Ele me chamava, ele queria sair dali! Era como se falasse e eu não era capaz de resistir-lhe! O opala escolhe seu condutor. Deu trabalho, ah se deu, tirá-lo daquela garagem! Pois bem, passou muitos anos lá. E está faminto. É hora de dar sua boa cabeça para ele”.

Bernardi ergueu a pá, preparando o golpe fatal contra Charles.

“Solte essa pá, seu assassino imundo!” – gritou uma voz atrás de Bernardi.

Bernardi abaixou vagarosamente as mãos, soltou a pá no chão, e foi se virando lentamente.

“Meu Deus, é o professor Mendez! Se afaste dele, assassino! E ponha as mãos pra cima!” – ordenou aquela que impedira o golpe e apontava uma arma na direção da cabeça de Bernardi.

– “Srª Cabot!” – exclamou Bernardi. “Não deveria estar dormindo para abrir sua lojinha de livros cedo? O que a faz estar aqui, bruxa?”.

“A história que o professor Mendez me contou não me saía da cabeça. E resolvi ir até o local onde ele teve as visões para examinar as energias e resíduos astrais do local. Então vi o opala partir em perseguição ao Passat e segui a direção em que foram. Levante as mãos acima da sua cabeça, sargento!” – ordenou Cabot. Bernardi não obedeceu. Charles reparou no fusca velho estacionado. Reconheceu o veículo no qual dera a fechada, metros antes do ponto da estrada onde vira o opala as primeiras vezes.

“Calma, velha! Tem certeza de que esse trabuco enferrujado ainda atira? Lembrou-se de conferir se está carregada?” – disse Bernardi.

“Levante as mãos, sargento! Eu não vou hesitar em disparar!”

“Vá com calma, velha bruxa! Alguém pode se machucar assim! Já atirou em alguém? Sabe o que é coice de revolver? Não! Sei que não! A senhora não atiraria em alguém, não é, bruxa?”.

“Levanta logo as mãos, sargento!” – disse Cabot, com a arma nas mãos tremulas.

“Vamos, Srª Cabot, seja boazinha e me entregue esse trabuco enferrujado e eu lhe livro de prestar conta sobre porte de arma ilegal”.

Os faróis do opala desocupado piscaram duas vezes. Foi então que a Srª Cabot cometeu um terrível erro. Deixou sua atenção se voltar para o carro.
Aproveitando-se do momento de distração da velha, Bernardi sacou a arma que levava na cintura e disparou, acertando um tiro certeiro no peito esquerdo da velha, que caiu morta.

Mas enquanto se ocupara da velha, o Sargento Bernardi deixou de perceber o que Charles fazia. O professor se levantou apanhando a pá e enquanto Bernardi ainda saboreava ter vitimado a velha Srª Cabot, Charles, com a pá, desferiu, com toda a força que o medo, o ódio e a dor por Monica lhe concediam, um golpe contra a cabeça do sargento, que caiu, deixando escapar a arma da mão.

Bernardi caído atordoado, com a cabeça sangrando, esticava-se para recuperar o revolver que lhe escapara.

Charles golpeou com a pá, arrancando a mão de Bernardi.
O sargento urrou de dor, se virando, ficando de frente para o professor.
A última coisa que Bernardi viu foi Charles erguendo a pá.

– “Mande lembranças ao Diabo por mim, sargento”.

Charles matou Bernardi, decapitando-lhe com a pá.

O professor olhou para seu carro em chamas, onde o fogo consumia o corpo de Monica, e olhou para a pobre Srª Cabot caída. Então voltou o olhar para o Opala diplomata.
Caminhou lentamente até ele. Ao se aproximar tocou-lhe a lataria. Escorregou a mão esquerda pela lateral do carro. De frente para a porta do motorista, colocou a mão direita sobre o teto. Ficou assim por alguns instantes. Examinou o interior do carro, apanhou as chaves na ignição. Pela janela, jogou a pá no banco trasseiro. Voltou até onde estava o corpo de Bernardi. Abaixou-se e apanhou pelos cabelos a cabeça do sargento. Erguendo-a olhou-lhe a cara.

– “Boa cabeça!” – disse.

Mendez levou a cabeça e a guardou no porta-malas do opala. 
Entrou no carro, ocupando o acento do motorista, corria as mãos pelo volante, sentia satisfação por estar de posse do Opala assassino. 

Olhou aquele local pela última vez, antes de partir.
 A cena não lhe era nova. Sonhou várias vezes com esses eventos, nas noites em que acordara gritando em sua cama.

Charles Mendez deu a partida no opala e com ele ganhou a estrada.
Acelerava a morte sobre rodas pelo asfalto dentro da noite sombria – assim como a cigana lera em sua mão.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

O Assassino do Opala - cap 6



Penúltimo Capítulo

Ao ver o opala vindo atrás deles, Charles pressionou o pedal do acelerador até o fundo. O carro do professor rangeu em arrancada. Monica assustada olhou para trás e viu o opala.

“Você está louco, Charles?”
“Não! Você não o está vendo? É o Opala!” – gritou o professor.
“Charles, é só algum garoto desmiolado correndo com o carro!”

Charles via o Opala se aproximar rapidamente – seu carro não era páreo para um opala de seis cilindros. Iniciava-se uma caçada, semelhante à caçada de um gato a um rato. Mas sem que o rato tivesse qualquer buraco onde se esconder. A estrada estava livre e não havia, por muitos quilômetros adiante, nenhuma rua secundária, não havia outros veículos no caminho. O gato pegaria seu rato.

“Charles, é só um opala qualquer! Deixa ele passar!”
“Ele não quer passar! Ele quer nos matar!”

O som potente do opala soava agora já próximo à traseira do carro de Charles.
Mendez olhava para o retrovisor central tentando ver o condutor do opala. Mas tudo que via era a luz cegante dos faróis altos do seu perseguidor.

O opala avançou batendo no para-choque traseiro do carro de Charles, fazendo-o solavancar à frente! Monica gritou!

“Meu Deus! O que é isso, Charles?”
“É ele! Quer nos matar!”

O opala piscou os faróis e então buzinou prolongadamente.
Nova buzinada e nova investida contra a traseira do carro de Charles.

“Não! Não pode ser, Charles!”

O opala permitia que o carro do professor escapasse um metro de distância para então tornar a acertá-lo com força! Nova buzinada!

Monica começou a chorar, temendo pela vida e arrependida de nunca ter acreditado no marido: “Charles, me perdoa! Como alguém acreditaria nisso?”.
– “Eu a perdoo, Monica” – o professor respondeu com sinceridade no coração.

O motor do opala rugia fazendo Charles sentir como quem ouvia o som da fúria maléfica do demônio.

Os carros seguiam em altíssima velocidade.

Na primeira curva da estrada o carro de Charles inclinou-se, derrapando para o lado enquanto os pneus lutavam para manter-se colados ao asfalto. O carro do professor oscilou, perdendo a direção, então se aprumou e transpôs a curva, lançou-se no ar, capotando várias vezes sobre o campo que margeava a estrada.

O lado do carona levou a pior! Quando finalmente o carro de Mendez parou de capotar, ficando de cabeça para baixo, ele viu Monica com o pescoço quebrado ao seu lado. O rosto sem vida de olhos arregalados era uma horrenda visão.
Charles lutou para conseguir sair pela janela se arrastando, e com muito esforço o conseguiu.

Desesperado, o professor se arrastava para longe de seu veículo. Assim que se distanciou um pouco ouviu e viu o clarão da explosão atrás de si.
Olhou por sobre os ombros para o carro em chamas onde jazia a esposa.
O professor caiu em pranto desesperado. Chorou amargamente a esposa morta.

O opala seguiu o carro que capotou até alguns metros de distância do ponto onde parou.

Charles escondia o rosto, apoiando a testa sobre os braços cruzados, enquanto chorava.

Então ao silenciar a explosão, o professor ouviu o rangido de passos vindo em sua direção.

Virou-se vagarosamente para ver o vulto de um homem, que tinha atrás de si a luz dos faróis do opala.

Charles tentou se arrastar para longe dele, sem conseguir. O vulto cuja identidade se ocultava pela luz dos faróis do opala se aproximava calmamente. O homem trazia uma pá em uma das mãos.

Charles voltou a olhar para frente e a tentar inutilmente se arrastar para longe do sujeito que se aproximava. Desistindo quando percebeu que o homem já estava bem atrás dele.

O Assassino do Opala estava parado de pé logo atrás do professor.



Continua...

terça-feira, 27 de agosto de 2013

O Assassino do Opala - cap 5



Capítulo 5

Charles Mendez se tornou obcecado pelo opala! A explicação que o que vira poderia ser uma “assombração de resíduo” lhe parecia plausível. Ele poderia ter escolhido acreditar nisso, tomando-o como verdade, e seguir a vida, deixando o episódio para trás. Mas não era capaz! O professor não conseguia deixar de pensar sobre o opala. Ele queria saber toda a verdade sobre o “Assassino do Opala” – era isso em que ele quis acreditar. A verdade por trás de tudo era: Charles Mendez desejava estar frente a frente com o opala novamente.

Quando Monica, sua esposa, encontrou o livro sobre fantasmas, escrito por alguém que se proclamava ‘bruxa’ e com selo de uma loja esotérica, aumentou sua crença de que o marido estava mentalmente perturbado com as visões que afirmava ter tido do opala repleto de corpos decapitados. Essa também deveria ser a explicação para os pesadelos de Charles.

O professor passou a acordar aos gritos e assustado todas as noites. “Um sonho horrível, Monica, um pesadelo” – era o que respondia antes que a esposa, que acordava com os gritos, fizesse a pergunta pertinente. Monica se limitava a um “Era só um pesadelo, querido, fique calmo, está tudo bem, vamos voltar a dormir” – e ela se virava para voltar ao sono, sem disposição para ouvir novamente o marido falar algo sobre o opala.

Charles começou a sair sem explicar o que iria fazer e a demorar fora – O professor começou a frequentar a biblioteca municipal, onde pesquisava jornais antigos da cidade. Encontrou algumas poucas notas sobre o Assassino do Opala em jornais de maior renome. Nos jornais populares, dados a matérias sensacionalistas, no entanto, encontrou um vasto material: fotos de vítimas do assassino, relatos de pessoas que afirmavam que o teriam visto, retratos falados... Entre os casos havia todo tipo de assassinato e brutalidade: mortes por asfixia, uso de arma branca e de fogo, estrangulamento, atropelamento... Decapitação, estupro, esquartejamento... As vítimas eram de todas as faixas etárias, classes sociais e ambos os sexos... E as descrições do assassino eram diversas. – Tal como havia relatado o Sargento Bernardi, quando o professor esteve na delegacia. – A única coisa que unia todos aqueles crimes era: um opala diplomata preto. Mendez começou a criar sua tese pessoal sobre o assassino do opala.

Monica começou a cobrar de Charles a verdade sobre aonde ia e por que demorava tanto. Não que a esposa estivesse desconfiada de traição por parte do marido. Ela acreditava que fosse o que fosse, estava relacionado ao “Assassino do Opala”.

Em uma discussão o professor admitiu que vinha pesquisando sobre o caso do Assassino do Opala na biblioteca. “Charles, você tirou uma licença para procurar se acalmar sobre esse assunto e não para se afundar nele!” – disse Monica. E se seguiu uma discussão que terminou com a esposa expressando um sentimento inconfesso: “Charles, já se deu conta de que você tem se dedicado mais a esse Assassino do Opala do que a mim? Que não passamos mais tempo juntos? Eu tenho me sentido só!”. Mendez se lembrou da harmonia em que o casal sempre estivera antes do episódio em que ele vira o tal opala. “Desculpe-me, Monica” – disse o professor reconhecendo que sua esposa estava certa. Eles estavam se afastando desde as visões que ele teve do opala na estrada. Charles a abraçou prometendo que ela não voltaria a se sentir só e propôs que fossem jantar fora aquela noite.

O casal foi a um modesto, mas bom restaurante – de acordo com os recursos do professor. 
Charles foi romântico e procurou fazer com que as coisas entre ele e a esposa voltassem à harmonia. A noite se prolongou além do restaurante – Charles a levou a um motel, como nos tempos antes do casamento, onde estiveram juntos com entusiasmo semelhante ao de seus primeiros encontros íntimos.
Infelizmente era a última noite que passariam juntos.

Quando voltavam para casa Charles não quis fazer um caminho mais longo para evitar a estrada onde vira a cena do opala com os corpos. 
Quando Monica percebeu que eles passariam pela estrada onde tudo começou questionou o marido.

“Charles, você acha que tem condições de passar por aquela estrada?”
“Monica, não quero ser prisioneiro disso! Preciso enfrentar essa estrada!”
“Dê meia-volta, Charles! Você ainda não tem condição de passar por esse caminho!” – 
Monica percebia a aflição tomando conta do marido.
Ao fazerem a curva e ingressarem na estrada em que Charles vira o opala, o professor não percebeu outro veículo, dando-lhe uma fechada. Quase houve uma colisão.

“Meus Deus, Charles! Você não viu o fusca? Você quase bateu nele!” – gritou a esposa.
Charles não respondeu. O ponto onde vira o opala estava só alguns metros à frente. 
O professor sentiu a garganta secar, e o suor escorrer por sua testa. Estava pálido e tremendo. Monica parou de falar e assistia ao estado emocional do marido.
O ponto da estrada se aproximava, o coração de Charles parecia que lhe saltaria a qualquer momento pela boca. Sentiu dificuldade de respirar, suas mãos suadas escorregavam no volante. 

Passaram pelo exato ponto onde o professor vira o opala, sem que ele visse a cena se repetir ou qualquer coisa fora do normal acontecesse. Charles começou a se acalmar e a procurar voltar a respiração ao ritmo normal. 

Depois de terem se distanciado cerca de trezentos metros do local, Charles disse:
“Tudo bem, Monica! Está vendo? Está tudo bem!”
“Agora vamos para casa, querido! E prometa que vai esquecer toda essa história de opala, tá bem?”.

Pneus de carro cantaram alto atrás deles.

Charles ao ouvir o som dos pneus cantando se aterrorizou e virou rápido o pescoço todo para trás. 
E o viu! Saindo da mesma rua em que o professor o vira descer naquelas três noites seguidas, o opala diplomata preto fazia a curva em alta velocidade, vindo atrás deles! A visão do opala negro com os faróis acesos em meio à fumaça que provocou ao fazer a curva era como a visão do próprio demônio vindo em seu encalço exalando fumaça pelas narinas.


Continua...

domingo, 25 de agosto de 2013

O Assassino do Opala - cap 4



Capítulo 4

O professor Charles Mendez chegou ao endereço de livraria esotérica mais próxima. Um local completamente excêntrico! A loja era repleta de coisas estranhas dependuradas por todos os lados, prateleiras com os itens mais esquisitos que já vira! Charles se sentia desconfortável ali. Era um homem da Ciência e estava numa loja de livros esotéricos. Perguntava-se se não estaria sendo ridículo ao procurar respostas em um lugar assim, e se sentia envergonhado. Mas já estava ali, então, resolveu encontrar algo sobre “fantasmas”. Procurou por bancas de livros e encontrou algo sobre fantasmas na seção de Bruxaria. Apanhou o livro e se dirigiu ao caixa da loja. Lá estava uma senhora, que aparentava ter por volta de oitenta anos, tão, ou mais exótica do que a loja em que se encontrava. Vestia algo que lembrava as roupas dos hippies, tinha os cabelos pintados na cor castanho, completamente bagunçados e... tão estranho: enfeitados com várias penas coloridas. Mendez, bastante sem jeito, a cumprimentou.

“Boa tarde” – o professor disse nervoso.
“O que houve?” – perguntou simpática a atendente – “parece que você viu um fantasma!” – comentou em tom de brincadeira.
“Er... Talvez eu tenha visto mesmo” – Charles respondeu, entregando o livro para ela registrar.
Ela reparou no livro sobre o balcão: “Guia das Bruxas sobre Fantasmas e o Sobrenatural”
“Parece que eu não estava errada ao lhe perguntar sobre fantasmas” – ela comentou.
“Isso é embaraçoso, sabe? Quero dizer, eu, sabe, nunca acreditei em coisas assim mas...” – ele se deteve.
“Mas... o senhor tem algo para o qual não tem uma explicação racional” – disse a mulher exótica.

Aquela estranha senhora na loja de livros esotéricos transmitia uma espécie de paz a Charles. Ela, tirando todo aquele visual exótico, o fazia se lembrar de sua mãe.
Desde que vira o opala não tivera paz. Charles se sentiu confortável para confessar-lhe.

“Eu... vi algo, algo numa estrada e bem... não encontro explicação”.

O professor falou-lhe então detalhadamente sobre as três vezes em que vira o tal opala.

“Como o senhor se chama?”
“Charles...”
“Senhor Charles, sou Sarah Cabot. Se veio até um local como este e está levando um livro da Gerina Dunwich, talvez não se importe de saber a minha opinião!”
“Eu...” – hesitou por um instante – “gostaria, sim”.
“Pelo o que o senhor me contou, creio que o que o senhor viu é uma Assombração de Resíduo”.
“O que seria isso?”
“É o seguinte: a assombração ‘está lá’, mas não há um fantasma, um espírito, o senhor me entende?”
“Confesso que não”.
“Acho que posso explicar melhor! Quando algo muito dramático acontece, especialmente envolvendo mortes, uma cena pode ficar ‘gravada’ e se repetir incessantemente, como se fosse um DVD! A cena do opala com os corpos foi algo real, concreto, material que aconteceu e ficou gravada naquele lugar! A cena se repetiu no momento em que o senhor esteve lá, mas essa repetição da cena não aconteceu apenas quando o senhor esteve lá, ela se repete o tempo todo! Quando o senhor esteve lá, o senhor foi, por sua capacidade psíquica, capaz de ver a cena! Quando há uma assombração de resíduo não há muito que se fazer! Talvez essa cena se repita ainda por séculos naquele local, mas é completamente inofensiva!”

Ela sorriu, pois estava segura de que não havia perigo envolvendo o que lhe fora relatado.

“Entendo o que diz, mas... Eu nunca fui de ver vultos ou qualquer coisa assim, sei de gente que vê... Mas eu nunca!”
“Isso é comum, senhor... Charles! Muitas pessoas passam a vida sem nunca terem permitido que suas mentes tivessem uma percepção como estas... nunca viram nada, mas um dia a capacidade psíquica aparece, porque todos a temos. O senhor vai ler algo nesse livro sobre assombração residual certamente”.
“Estou envergonhado, mas... longe de mim querer parecer muito cético, afinal, vim até aqui e... bem! Mas confesso que tenho dificuldade em acreditar que tais coisas realmente existam!”
“Não é porque você não acredita em algo, que esse algo deixará de existir!”
“Está certo! Obrigado, muito obrigado pela conversa senhorita...”.
“Cabot”
“Cabot! Vou ler o livro!”



Continua...

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

O Assassino do Opala - cap 3



Capítulo 3

Uma semana depois, Mendez estava em frente à universidade, indo apanhar seu carro, após as aulas, quando viu um opala diplomata preto passar lentamente pela rua, e reconheceu ser o mesmo opala que encontrara na estrada. Sentiu todo o seu corpo gelar.
“Não é possível! É outro carro!” – ele pensou. No entanto, percorrendo seu novo e bem mais longo caminho para casa, admitiu para si – “A quem quero enganar? Sei que era ele! Era o opala!”.

Charles relatou a nova visão do opala à sua esposa.

“Charles, você não está bem! Toda aquela história está mexendo com você! Você precisa de uns dias!”
“Talvez eu possa pedir uns dias...”.
“Charles, querido, você tem mesmo certeza de ter visto esse tal opala?”
“Eu tenho, Monica! Disso, tenho plena certeza!”
“Charles, aquela história não faz sentido! Você não sonhou aquilo? Pode ter sido, querido! Por favor! Você não cochilou ao volante e pensou ter visto isto?”
“Não, Monica, eu vi o opala, e vi os corpos decapitados!”

O professor tirou uma licença, mas não podia, por ordem policial, deixar a cidade, o que talvez fosse bom para tentar arejar as ideias.

Certo dia, Charles saía de um banco quando foi interpelado por uma cigana na rua.

“Posso ler a sua mão, senhor?”
“Não” – ele respondeu ríspido.
“Posso descobrir algo importante se me deixar ler a sua mão, não vou cobrar nada, apenas recebo se o senhor acreditar que deva me gratificar com alguma quantia – depois que eu ler a sua mão”.
O professor estava receoso, mas cedeu à insistência da cigana. Imaginou que talvez não estivesse tentando distraí-lo enquanto lhe batia a carteira. E quem sabe, apesar essa ideia lhe parecer absurda, seria a dita cigana capaz de saber algo sobre o opala?
Mas assim que ela segurou a mão de Charles e olhou para as linhas de sua palma, a expressão da mulher se tornou muito assustada. Ela soltou imediatamente a mão dele e começou a se afastar, depois de alguns passos ainda olhando com olhos arregalados na direção do professor ela se virou e começou a andar rápido.
Mendez andou depressa para alcançá-la e a segurou pelo braço.
“O que? O que você viu?” – ele perguntou nervoso.
“Não vi nada”.
“Como nada? Por que saiu assim?” – o professor pensou ter tido a carteira batida, mas já estava agora, pensando se ela teria visto algo sobre a cena do opala na estrada e isso que a assustara.
“Quer mesmo saber? Quer saber o que vi? Eu vi a morte, a morte correndo como um carro veloz, próxima demais!”
As palavras da cigana o assustaram, ele soltou o braço dela e a deixou. Ficou parado vendo a mulher se afastar.

“Correndo como um carro veloz” – essa frase se repetia na mente dele. “Será que ela o disse por ter visto algo relacionado ao opala?”.

Depois ele começou a andar muito depressa, voltando ao estacionamento onde deixara seu carro. Próximo ao estacionamento, mais uma vez acreditou ter visto o opala preto passar na rua.
Apontou e questionou, feito louco, a outros na calçada “Você viu? Viu o opala que passou aqui agora?” – perguntava gritando às pessoas que se assustavam com sua atitude e se afastavam.
Charles procurou se acalmar e voltou para casa pensando “Como ninguém o vê? Por que só eu o vejo? Tenho certeza de que se eu voltar àquela estrada ele vai estar lá! Vai se aproximar vagarosamente de novo e cheio de corpos decapitados!”.

“Charles, você precisa de um psicólogo, um psiquiatra! Não existe opala assassino! O carro que você viu hoje foi um opala qualquer na rua!” – disse sua esposa quando o marido chegou e relatou ter novamente visto o opala.
“Você, pelo menos você, deveria acreditar em mim, Monica!”.

Algo passava pela cabeça do professor. Era louco demais, mas, tudo era louco demais, era uma possibilidade, ainda que, aparentemente, tão fora da realidade!
– “O Assassino do Opala está morto! Mas eu vi o opala! E no local onde ele foi encontrado há mais de vinte anos! Mais de vinte anos! Só eu! Só eu o vi! Sei que vi...”.

Charles pesquisou na Internet endereços de lojas de livros sobre fantasmas, assombrações e coisas do gênero. Começava a fazer sentido em sua cabeça que o que vira havia sido o fantasma do Assassino do Opala!



Continua...

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

O Assassino do Opala - cap 2



Capítulo 2

No dia seguinte o professor Charles Mendez compareceu à delegacia. 
Os policiais colheram seus dados e começaram a interrogá-lo.

“Então, senhor... Mendez! O senhor afirma ter visto um carro preto com luzes apagadas vagar desengrenado até parar exatamente à frente do seu caminho, fechando metade da estrada e neste carro havia um amontoado de pessoas recentemente assassinadas e decapitadas?”
“Sim... Era um opala diplomata, creio que modelo do ano 1989”.
“O senhor nos informou um número de celular. Por que o senhor não ligou imediatamente após presenciar o ocorrido, tendo esperado até chegar à sua casa?”
“Eu fiquei muito assustado, o senhor pode imaginar!”
“O senhor estava muito assustado para telefonar, mas não para reparar o modelo exato do carro?”
“Eu sou aficionado em carros... Não me era difícil saber o modelo”.
“Em que horário o senhor avistou esse opala modelo comodoro preto?”
“Diplomata! Eu disse modelo diplomata! Foi por volta das onze e vinte da noite! Deus do Céu, sou inocente! Alguém cometeu assassinatos bárbaros!”
“Ninguém disse que o senhor não seja inocente! Verdade, o senhor disse diplomata! No entanto, sua história é um tanto quanto estranha! Quanto tempo o senhor gastou desde o momento em que viu o opala até a sua casa?”
“Não mais que vinte minutos”
“Vinte minutos é um tempo consideravelmente curto daquele ponto da estrada até o seu endereço”.
“Eu corri, pois estava apavorado”.
“Deveríamos lhe dar uma multa por excesso de velocidade? O senhor costuma desobedecer às leis?”
“Deus do Céu! Eu fugi apavorado! Alguém matou e decapitou aquelas pessoas!”
“É melhor o senhor se acalmar, senhor Mendez”. – disse o policial em tom que soava ameaçador.
“Desculpe-me” – o professor respondeu brando.
“Então, por que, a viatura não encontrou nenhum sinal desse opala que o senhor diz ter visto, nem corpos decapitados, nem nada em absoluto? Como um carro preto e apagado fica atravessado numa estrada, ainda em horário de bom movimento e nenhum outro motorista  bateu nesse veículo parado, num ponto, que, acrescentemos, é escuro, nem houve nenhuma outra queixa sobre ele, senão a sua?”
“Eu não sei! Alguém pode ter tirado o opala de lá!”
“O senhor, por acaso, crê que a polícia não tenha o que fazer à noite?”
“Não senhor, senhor policial”.
“Passar trote de casa para a polícia vai fazer com que o senhor durma no xadrez. Como podemos saber que sua intenção não era mais do que uma brincadeira e falta de respeito, desacato com a autoridade? Que sua intenção não era desviar a atenção da viatura policial de alguma outra coisa? O senhor ficará detido até que a polícia averigue melhor essa sua história”. 


Os policiais o colocaram para passar a noite em uma cela especial, devido a ter curso universitário. Pela manhã foi chamado para o gabinete do sargento Bernardi.
Douglas Bernardi era um homem alto, corpulento, de cinquenta anos, cabelos começando a se tornarem grisalhos, olhos castanhos e ar de ser um servidor público exemplar.

“Bom dia, senhor... Mendez! Ou seria mais adequado chamar-lhe ‘professor’? Qual matéria o senhor leciona?”.
“Bom dia! Leciono Física na universidade. Pode me chamar como preferir...” – o professor olhou para o policial como quem perguntasse seu nome.
“Sargento Bernardi”. – “É preciso ter uma boa cabeça para lecionar Física na Universidade! Bem, estou a par de seus dados: Professor universitário, sem antecedente de passagem pela polícia... O senhor me parece ter um perfil honesto, professor. E vou deixá-lo a par da situação! O senhor se mudou para esta cidade não faz muitos anos, não é mesmo?”.
“Sim, mudei-me, digo, nos mudamos, minha esposa e eu, faz cinco anos para cá”.
“Entendo. E, portanto, é provável que nunca tenha ouvido nada sobre o ‘Assassino do Opala’!”.
“Não”.
“Nem senhor, e certamente os jovens policiais com quem o senhor conversou. Pois bem, vinte e três anos atrás, em 1990, eu já estava na polícia. Naquela época correu por bastante tempo rumores de um suposto ‘Assassino do Opala’. Essas coisas costumam deixar de ser comentadas após poucos anos. Na época a polícia acreditou ser uma dessas... lendas urbanas! Os bairros que são atravessados por aquela estrada não são exatamente os mais pacíficos, se o professor me entende. Sei que entende. A polícia acreditou a principio que a história sobre o tal ‘Assassino do Opala’ fosse um folclore que surgiu do fato de muitas pessoas terem desaparecido em datas e locais próximos, acreditávamos que se tratava de casos sem ligação entre eles. Até porque, havia histórias dizendo que o tal assassino tinha cabelo preto e olhos escuros e também histórias de que seria loiro e com olhos claros! O imaginário popular também não tardou a justificar essas contradições. Diziam que o Assassino do Opala, sabendo de sua procura havia pintado o cabelo e passado a usar lentes! Ainda havia contradições sobre o que ele fazia com suas vítimas e também não tínhamos um perfil preferido de vítima! O Assassino do Opala parecia ser um psicopata agindo sem um padrão, e, portanto, irreal. O professor está compreendendo?”.
“Sim, senhor”.
“Esse folclore não incomodava tanto à polícia, afinal, seria apenas folclore, e as pessoas estavam mais cuidadosas, e isso é bom quando se enfrenta uma série de desaparecimentos. Não preciso dizer que havia o fato de ninguém aceitar carona de um opala” – mencionou a carona achando graça – “Infelizmente, professor, sua história se torna muito estranha ao passo que não nos foi possível encontrar um mísero vestígio de autenticidade nela. Mas ela me preocupou! Enfim... Aconteceu que o Assassino do Opala foi encontrado algum tempo depois”.
“Vocês o prenderam?”
“Não, infelizmente não. Não conseguimos por as mãos no desgraçado vivo! Ele foi encontrado morto – o que depois se verificou ter sido por overdose – dentro do veículo, o opala. Havia corpos decapitados no banco de trás. Aparentemente ele havia se picado – era viciado em heroína – e quando saiu para despachar os corpos, teve a overdose no caminho. Ele estava com o carro desligado e desengrenado aproveitando o fato da rua ser inclinada, provavelmente para evitar barulho e a possibilidade da descoberta de seu esconderijo. O carro seguiu desengrenado até o exato local em que o senhor afirma ter visto um opala, igualmente preto, modelo diplomata e recheado de corpos”.
“Então, o Assassino do Opala está fora de ação, está morto?”
“Há mais de vinte anos, professor”. 
“O que houve com o carro, com o opala?”
“Foi levado para alguma garagem da polícia e, bem, hoje deve ser apenas um monte de ferrugem!” – o sargento Bernardi prosseguiu dando fim à conversa: “Veja bem, eu vou liberar o senhor, professor. Mas o senhor tenha ciência de que estará sob nossas vistas. Eu receio que possa haver algo de verdade nesse seu relato, apesar de parecer tão estranho! Receio que alguém possa estar querendo 'ser um novo Assassino do Opala', ou trazer de volta o medo acerca desse criminoso! Creio que seja melhor para o senhor não passar por aquela estrada, pelo menos nos próximos dias”. 

O professor Charles Mendez mudou seu itinerário para o trabalho, evitando aquela estrada. Não houve mais notícias sobre um opala preto naqueles dias. Ninguém além de Charles vira o opala!



Continua...

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O Assassino do Opala - cap 1



O Assassino do Opala


Capítulo 1

Após as aulas noturnas da universidade o professor Charles Mendez dirigia pela estrada que o levaria de volta para casa.
Em dado momento viu, já bem próximo de seu carro, surgir um opala modelo diplomata de cor preta com faróis apagados, que, vindo desengrenado e lentamente de uma transversal, atravessou a estrada, parando ao encostar-se ao alto meio fio e fechou o sentido da pista por onde o professor trafegava.
Primeiro Mendez se admirou e ficou intrigado. Freou seu carro e passou alguns segundos olhando o opala. Então uma das portas trasseiras do opala se abriu e o professor Charles viu corpos decapitados amontoados no banco trasseiro do opala diplomata.
Charles ficou atônico nos primeiros instantes com o que viu. Sem conseguir tirar os olhos incrédulos do amontoado de corpos. Sentiu vontade de vomitar devido à forte cena. Quando conseguiu ter alguma reação o professor engrenou a marcha primeira em seu carro e saiu contornando com receio o opala. Cerca de cem metros depois ele pisou fundo no acelerador ansioso por se afastar o mais depressa possível daquele opala. Parou uma vez no caminho para abrir a porta e vomitar.

Ao chegar em casa, Charles procurou evitar conversa com a esposa, disse que estava se sentindo mal como desculpa para sua visível aparência assustada e rosto pálido. Sua esposa não fez questão de saber melhor o que poderia ter acontecido, aconselhou, apenas, que ele se medicasse.
Charles achou melhor manter segredo do que vira. Certamente o veículo com os corpos seria encontrado e quem quer que tenha feito aquilo provavelmente não o vira passar.

Na noite seguinte, após lecionar, Charles, como era sua rotina, tornou a pegar a estrada que conduzia à sua casa. Ao chegar ao mesmo ponto da estrada, onde na noite anterior vira o opala, tudo se repetiu como em um deja-vu!
Novamente, na mesma velocidade, o mesmo opala diplomata preto cruzou a estrada bloqueando o progresso do carro do professor.
Ao ver o opala, Charles estremeceu, sentiu a boca secar, novamente atônico assistiu à porta trasseira se abrir, e novamente revelar um amontoado de corpos decapitados.
Tomado de terror o professor olhou assustado para todos os lados, e, novamente contornou cuidadosamente o opala, pisando fundo após alguns metros.

Dessa vez chegou em casa agitado. A esposa já havia se deitado. O professor então telefonou para a Polícia e contou sobre o opala com os corpos, dando referência de onde o havia visto.
“O senhor está nos telefonando a partir de um número fixo. O senhor confirma que este número é o de sua residência?”
“Sim, estou falando de minha residência”.
“Está certo, senhor... Mendez! Temos uma viatura próxima ao local e solicitaremos que averiguem o que nos relatou. Tenha uma boa noite”.

Na noite seguinte, seguro de que a polícia teria cuidado do caso, o professor Mendez não imaginava que mais uma vez ao passar por aquele ponto da estrada encontraria o mesmo opala preto e a cena se repetiria.
Apavorado arrancou com seu carro em disparada. Chegou a sua casa suando frio e tremendo aterrorizado.
Dessa vez sua esposa o esperava:

“Charles, o que, afinal, está acontecendo?”
Depois de algum tempo sem conseguir falar, o professor respondeu: “Preciso telefonar para a polícia!”.
“A polícia? Pois hoje à tarde a polícia esteve aqui e deixou uma intimação para você comparecer à delegacia! O que está havendo, Charles?”
“Eu não quis te contar, Monica, para você não se assustar, mas... mas...”.
“O que?” – perguntava a esposa impaciente – “Você chegou muito estranho nas duas últimas noites, Charles!”.
“Um carro desengrenado desceu de uma transversal fechando a pista quando eu retornava para casa! Isso foi anteontem! Eu... Eu não falei nada com ninguém, mas...”.
“Mas o que? O que tinha o carro?”
“Foi horrível, Monica! Você não pode nem imaginar!”
“Você vai dizer? E dizer o porquê da polícia querer que você compareça à delegacia?”
“Vou... É que estou com medo! Era um opala, acho que sem motorista e... e... no banco de trás!”
“Você desceu para olhar?”
“Não! A porta trasseira dele se abriu sozinha! E... havia muitos corpos de pessoas assassinadas! E estavam decapitadas! Horrível, não queira nem imaginar!”
“Meu Deus, Charles! E você foi se meter nisso? Você ligou para a polícia?”
“Sim... mas... só na segunda vez... foi... muito estranho! Aconteceu a mesma exata coisa nessas três noites! Sempre no exato momento em que estou passando naquele ponto da estrada! Na primeira noite pensei que eu por azar estava justamente ali! Mas se repetiu! Alguém está assassinando várias pessoas por noite! E... acredito que quem quer que esteja fazendo isso quer que eu veja! Mas por quê?”
“Isso é absurdo! Toda essa história é absurda! Uma coisa assim não pode ter acontecido três noites seguidas e sempre na hora em que você está passando com seu carro! E o que você faz? Liga para a polícia, Charles!”
“Mas... eu só liguei da segunda vez, e estou com medo, Monica. E se quem está fazendo isso pretende, não sei... me matar?”
“E por que alguém iria querer te matar?” (...)



Continua...

sábado, 17 de agosto de 2013

A Velha dos Gatos - cap 3



Terceiro e Último Capítulo

Os desaparecimentos do velho e da viúva já haviam sido percebidos e as pessoas do bairro especulavam o que poderia ter acontecido. Contudo, sem jamais desconfiar que a velha dos gatos tivesse algo a ver com os desaparecimentos.

A velha já não sentia remorso por ter matado. Sentia-se justa por eliminar inimigos. Estava disposta a eliminar qualquer inimigo que atacasse aos gatos.

Como podem odiar os amáveis gatos? Como podem ser capazes de fazer maldade com eles? Quem odeia um bichinho assim é ruim, não presta! E como a maioria das pessoas não gosta de gatos, a maioria das pessoas não presta. Quem faz maldade com gato não merece viver! Ninguém nesse bairro presta. Mas ninguém vai maltratar os meus gatos, eu não vou deixar! Ninguém

Dias mais tarde, a velha estava no quintal da frente de sua casa. Ouvira um barulho e acreditava que alguma bola teria caído lá e a procurava para furar.
Essas pestes não param de deixar essas bolas caírem aqui!

Então ela viu o carteiro chegando. Várias vezes a velha havia visto, de dentro de casa, aquele carteiro chutando algum de seus gatos que estivesse na calçada. E não foram só duas ou três vezes. 
Por que chutar o gato sem que o bicho tenha feito algo? Só por não gostar deles!

A velha estava tomada de ódio pelo sujeito, mas quando este foi colocar as contas em sua caixa de correio, ela o cumprimentou com falsa simpatia. O carteiro sorriu e respondeu de modo simpático.
É um fingido! Maldito fingido! Se ao invés de mim fosse um dos meus bichos que estivesse aqui ele chutaria o pobre!
A velha reparou no quanto suava a testa do carteiro – era a tarde de um dia muito quente. 
Ela fez um comentário sobre o calor, e o carteiro comentou sobre o árduo trabalho sob um sol daqueles! 
Ela consentiu com o que ele disse, e lhe ofereceu água gelada. Chamou-o para entrar na casa. Conduziu-o até a cozinha. À porta da cozinha, a velha, indicando a geladeira, o fez entrar na frente dela. Enquanto o sujeito se servia da água, ela apanhou uma faca muito afiada, que deixava pendurada na parede.
Ele virava o copo, quando ela, sem que ele a percebesse, se aproximou por trás e com precisão cirúrgica passou o lâmina na garganta dele. 

O copo de vidro se estilhaçou no chão, caindo da mão do homem que engasgava sangue, em seguida o carteiro caiu morto no chão da cozinha da velha.

Dessa vez ela nem teria o trabalho de levar o corpo, a carne fresca já estava lá.
Gatinhos! Gatinhos! Comida!

***

Mas aconteceu que um dia, depois de não vir se sentindo bem há algum tempo, sem dar muita importância ao seu estado. A velha amanheceu passando muito mal. Sua cabeça doía demais, sentia um enjoo muito forte. Demorou a tentar se levantar, e quando o fez, vomitou e sentiu muita tontura, parecendo que iria desmaiar. Apressou-se em voltar para a cama. Ficou lá ardendo em febre. Ela pensava em sair para ir ao médico, mas se sentia mal a ponto de não conseguir, sequer, chegar à porta da frente. Pensou em se arrastar até o telefone, mas se lembrou de que esse havia sido cancelado por atraso no pagamento das contas. 
Ficou quatro dias assim sobre a cama. Muitas vezes gemia ou chorava. Algumas pessoas que passaram em frente à casa ouviram os gemidos e choros, mas pensaram serem os gatos miando por causa de cio.

O gato preto, o primeiro que ela abrigou, apareceu na porta do quarto. E logo todos os demais gatos começaram a irem até lá. A velha se viu rodeada por seus mais de cem gatos. Ela, vendo todos ali, se enterneceu. Eles sentem que não estou bem! Eles vieram ficar comigo! Ficar com “a mamãe”! 

Ela os chamava e eles continuavam ao redor. O gato preto se aproximou vagarosamente, olhando para ela com seus enormes olhos amarelos.
Meu pretinho! – ela dizia esticando a mão para acariciar o animal.
Subitamente o gato preto abriu a boca de modo ameaçador e com suas garras afiadas arranhou violentamente a cara da velha. Sua ação foi seguida pelo ataque em conjunto dos mais de cem gatos! Desfalecida de todas as suas forças a velha foi incapaz de reagir e de suportar o ataque coletivo dos gatos, que não eram alimentados fazia quatro dias, gostavam de carne humana e estavam com muita fome.

Pela última vez, a velha dos gatos alimentou seus animais... 
com a própria carne!

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

A Velha dos Gatos - cap 2



Capítulo 2

O assassinato do velho ficaria no passado e seria esquecido! Ele provocou! Ele matou o gato! A culpa foi dele! Não se repetiria.
A velha procurava esquecer. Mas frequentemente se lembrava de como matou o velho.
Criou o costume de ficar na janela espiando a vizinhança.
Cada vez mais seu ódio pelas pessoas aumentava.
Ela, da janela, via os vizinhos passarem. Quando algum vizinho que já se queixara sobre os gatos passava pela calçada, a velha remoía lembranças das reclamações e piadas.
Sentia muita raiva. Passou a se distrair imaginando como seria matar o vizinho reclamão que estava passando, assim como fez com o velho, e dar o cadáver aos gatos como refeição! Imaginar amenizava um pouco a raiva. Não faria de novo! Não era assassina! Mas gostava de imaginar! O que tem demais imaginar? Bem que mereceriam!

Mas aconteceu que, mais uma vez, a casa dela foi denunciada à prefeitura.
Quem fez isso? Por que me perseguem tanto?
Porque são ruins! Gente ruim!
A velha passou a olhar todo vizinho que passava se perguntando qual deles teria feito a nova denúncia.
Foi a viúva! Com certeza foi aquela vaca! Eu vejo a cara dela quando passa aqui em frente e seu riso cínico! Ela acha que não a vi olhando pra cá quando recebi a notificação? Ela sorria, sabia o que era! Aquela desavergonhada! O que quer? Que eles sejam levados? Que sejam levados para virarem sabão? Quem é ela para perseguir meus bichos? Vadia! Todo mundo sabe o quanto ela é vadia! Todos sabem! Maltratava o pobre coitado do falecido marido nos últimos anos de vida dele! Batia no moribundo! O pobre diabo doente e dependente, no fim da vida, e ela acabou de matá-lo! Morreu de maus tratos! Ou de desgosto! A vadia chegou a trepar com outro dentro de casa, com o marido adoentado ouvindo tudo do quarto! E ela se incomoda com animais inocentes, que não teem a sem-vergonhice que ela tem! Ela é uma pecadora, isso que é! E uma assassina! Pobre marido! E ainda anda com o nariz em pé!

A velha passou a observar a rotina da viúva. Reparou que os moradores dos outros apartamentos do prédio da viúva saíam de casa antes dela. Ela rotineiramente saía cerca de uma hora e meia depois, para ir à padaria. Assim como o velho, a viúva estaria sozinha no prédio. E se chegasse a gritar... Bem, ninguém viria de outro prédio ver o que é!

Aquela mulher era uma ameaça aos gatos, não iria sossegar enquanto seus gatos não fossem levados pela carrocinha! E ela não merecia viver! Os gatos é que não mereciam virar sabão!
A velha estava decidida a matar a viúva! Sim! E dar o cadáver como refeição aos gatos, como fizera com o velho. Estava decidido. Mas como a mataria? Sabia o momento oportuno. Depois que os outros moradores do prédio tivessem saído se esconderia no hall de entrada, afinal a portaria ficava aberta, esperaria atrás da escada e daria à depravada oque ela merecia!

Pensando em como matar a viúva, a velha dos gatos viu linhas de pipa em seu quintal.

Quando caía uma pipa ou uma bola no quintal da velha as crianças não ousavam pedir. Era melhor deixar pra lá. Até mesmo uma pipa ou uma bola! Era a casa da bruxa!
A velha sempre furava as bolas que caiam no quintal e jogava, xingando, no meio da rua. As crianças não tinham coragem de tentar apanhar as pipas ou bolas que caíssem naquela casa! Sabe-se lá o que a bruxa faria com elas se as apanhassem no quintal – e claro que era uma bruxa, pois as bruxas gostam de ter muitos gatos. Quando a viam na rua, as crianças saíam correndo e gritando “A bruxa dos gatos! A bruxa dos gatos!”.

Aquelas linhas! Elas cortam! Linha com cerol!
A velha seguiu seu plano. Esperou a saída dos vizinhos da viúva, e se escondeu na portaria. Quando a viúva desceu a escada, a velha a atacou, laçando-lhe o pescoço por trás. E puxou até cortar a garganta da mulher! Como imaginara, a viúva chegou a gritar, mas ninguém veio ver! A velha olhou por alguns segundos a cena da viúva caída no chão e o sangue que se espalhou. Sentiu satisfação! Fizera justiça! Ela pagou pelo que fez ao marido e pela perseguição aos gatos! Ela pediu! Fez queixa à prefeitura!
A velha levou produtos de limpeza, uma faca e um saco de lixo dentro da bolsa. Novamente ela limpou a cena do crime, esquartejou o corpo e levou para casa dentro de um saco preto de lixo.

Comam! Comam gatinhos! Trouxe carne fresca!


Continua...

terça-feira, 13 de agosto de 2013

A Velha dos Gatos - cap 1



A Velha dos Gatos


Capítulo 1

Era em uma pequena casa antiga, com aspecto de estar abandonada por anos sem receber novos cuidados e com os efeitos da ação do tempo, de paredes verdes manchadas, telhas antigas imundas, janelas de madeira com a tinta descascando e alguns vidros faltando. No terreno, lotado de tranqueiras, o mato crescia. A casa parecia uma ilha no meio dos amontoados de cortiços e prédios de dois ou três andares. Era onde “a velha” morava.

Chamavam-na “a velha”, pois não sabiam seu nome. Morava há muitos anos sozinha e não recebia visitas de qualquer espécie. Era uma senhora solitária.
Não era dada a sociabilizar com os vizinhos. Nas poucas vezes que saía de casa, indo ao mercadinho ou à padaria do bairro, estava sempre com a expressão fechada.
Usava sempre os mesmos sapatos velhos, vestidos com estampas de flores, que pareciam terem sido comprados em brechó, meias-calças num tom um pouco mais escuro que a pele e os longos cabelos sem pintar sempre trançados.

Um dia abrigou um gato preto, que passou a ser sua companhia. Gostava do bichano atrás dela e se esfregando em suas pernas. Agradava-lhe a companhia do animal de tal modo que começou a abrigar todos os gatos de rua, que por ventura, aparecessem. Dessa forma que passou a ter em casa mais de cem felinos.
Ela passou a sorrir com eles, vendo suas brincadeiras e bagunças. Adorava chegar com o saco de ração e ter sua centena de gatos a rodeando.
A casa passou a ter as cortinas, sofás e todo móvel estofado rasgado. Deixava os gatos fazerem tudo o que queriam. Afinal, eram eles que alegravam seus dias, que já não eram mais solitários, Ela tinha aos gatos.

Se um dos mais de cem gatos não estivesse em casa ela notava prontamente sua ausência.

E foi por conta dos gatos que passou a ser chamada de “A Velha dos Gatos”. Achavam-na esquisita, estranha, esquizofrênica com todos aqueles gatos.

A vizinhança passou a reclamar com ela por conta dos felinos, que muitas vezes andavam pelos cortiços, deixando sujeiras, roubando sacos de lixo com restos de comida, ou se espalhavam pelos telhados miando durante a noite, especialmente quando havia cio. Nas vezes em que passavam em frente, os vizinhos resmungavam o quanto cheirava mal a casa da velha.
Houve uma queixa junto à prefeitura, da qual a velha recebeu notificação.

A velha que cada vez mais amava os gatos, aumentava cada vez mais também sua aversão às pessoas. Por que se incomodavam tanto com os pobres bichinhos? Que tanto mal faziam? Era preciso tanta reclamação só por conta de um miado, uma sujeirinha à toa, ou porque alguém foi deixar logo resto de peixe num saco de lixo pendurado?

A velha passou a ver todos os vizinhos como reclamões rabugentos. Aquela gente dada à pouca-vergonha, que implicava e perseguia os pobres bichanos inocentes! Como, afinal, podiam não gostar dos amáveis bichos?

Acontece que, vez ou outra, um dos gatos desaparecia, nunca mais retornando! Foram eles! Os vizinhos! Aquela gente ruim matou o bicho e jogou fora! Jogaram no lixo!
Uma lista de suspeitos passava por sua cabeça. Lembrava com ódio, cada um de quem já ouvira reclamações dos gatos.

Aconteceu que um velho ranzinza de um dos prédios vizinhos andou se queixando “do gato amarelo”, costumava roubar carne no apartamento dele – dizia.
Alguns dias depois o gato amarelo sumiu.
Aquele maldito velho! Ele matou meu pobre gato!
Não suportando mais acatar que os vizinhos matassem seus gatos ela foi ao apartamento do velho falar com ele.

O velho não havia matado o animal, mas sentiu satisfação ao pensar na possibilidade de provocar a velha dos gatos.

"Pois fui eu quem matou o gato! Esse animal é criação do Demônio! Gatos são do Demônio! Mas esse, não vai mais roubar carne de ninguém! Todas essas pragas de gatos deveriam ser mortas" – disse o velho.

A velha ouvindo isso foi sendo tomada pela raiva e pelo ódio. Sentia o sangue ferver! Maldito velho! Velho desgraçado! Tirou a vida do bicho, que não faz nenhum mal!
O velho sorria irônico e satisfeito assistindo a expressão indignada da velha, até que lhe deu as costas num ato de desprezo.
Impulsionada pela raiva a velha apanhou o extintor de incêndio do corredor do prédio e desferiu um golpe com toda a força que pode contra a cabeça do velho que lhe dava as costas.
O velho caiu morto e uma poça de sangue se formou em torno de sua cabeça. Seus olhos estavam esbugalhados e as feições pareciam as de um rosto surpreso. A velha sentiu satisfação vendo o velho assim. Não tinha mais graça agora, não é mesmo? Não ria e debochava mais do gato que matou! Sim! Ele mereceu! Mereceu isso! Como pode dizer aquilo dos gatos?

A velha ficou ali assistindo à imagem do velho ranzinza morto, até que o auge de sua fúria passasse. Começou então a se preocupar em ocultar o que havia acontecido.
Friamente ela limpou a cena do crime o melhor que pode. Mas havia o problema de como sumir com o corpo sem ser vista! Ela, então, foi à cozinha do apartamento do velho, encontrando uma faca de cerra nas gavetas, com a qual cortou o corpo em diversas partes. Teve tempo suficiente para isso, pois os moradores dos outros dois apartamentos estavam fora e só chegariam à noite.
Ela colocou os pedaços do corpo do velho dentro de um grande saco preto de lixo. Quem vai notar logo a falta de um velho rabugento e sozinho desses? Tudo vai ficar bem! Quando derem por sua falta, será tido como desaparecido! Que ironia seu velho imundo! Agora está num saco de lixo, assim como meu pobre gato que você matou!

Mas depois de conseguir retirar o corpo do prédio onde ela o despejaria? Não podia ser encontrado!
Decidiu então, por algo, que lhe pareceu uma justa vingança.
Levou o saco com o corpo esquartejado do velho para sua casa.
Abriu o saco no chão da cozinha, dando o cadáver como carne fresca para seus gatos.
A essa altura sentia algum remorso por ter matado o velho. Ele merecia morrer, é verdade. Mas isso fazia dela uma assassina! Tudo bem, isso ficaria no passado, seria esquecido. Com o tempo ela não se lembraria mais dele!



Continua...