Cidade
dos Mortos
João Silva, natural de Caruaru (PE), trabalhava há 15 anos como motorista de caminhão pelo interior do Ceará. Ele conhecia aquelas velas estradas poeirentas como a palma da mão. Com a segurança de sempre, iniciou mais uma longa viagem na tardinha de um dia quente. Anoiteceu, mas ele sabia que antes das 11 horas da noite chegaria a uma pequena cidade onde poderia dormir.
A viagem transcorria sem novidades, até que viu algumas luzes alinhadas ao longo da estrada, antes do tempo previsto. Era uma cidade, mas ele não a conhecia. Ficou desconfiado: teria errado o caminho? Estaria perdido? Curioso, tocou o caminhão em frente. Ao entrar na cidade, João Silva diminuiu a marcha e começou a observar. As luzes que tinha visto de longe quase não iluminavam: eram tochas de chama azul arroxeada. As casas eram todas brancas e – além delas – não existiam bares, hotéis ou armazéns. Nenhuma placa indicativa. Nem pessoas nas ruas. Das casas, não vinha luz alguma. De repente, ele percebeu que a cidade não era real.
Com um gesto brusco acelerou o caminhão, mudou a marcha, mãos firmes no volante. Mas por mais que tentasse imprimir velocidade ao caminhão, este não reagia. Sentiu que uma forte ventania em sentido contrário o segurava, fazendo o veículo avançar muito devagar. Viu montes de capim seco rolarem ao vento pelas ruas da cidade morta. Seu maior desejo era sair dali, mas seus músculos estavam paralisados. Foi quando surgiu uma luz real à sua frente. Percebeu que tinha abandonado a cidade-fantasma e se aproximava, agora, a grande velocidade, de um posto de gasolina. Encostou na beira da estrada e desmaiou. Foi socorrido imediatamente pelos demais motoristas que estavam por ali. Permaneceu sem sentidos um bom tempo e, ao acordar, contou o que tinha acontecido. Os homens ouviram atentamente, com muito respeito. Depois, em conversa, ele ficou sabendo que não tinha sido o único a conhecer aquele lugar maldito. Muitos já passaram pela cidade dos mortos.
Extraído de Revista Planeta, fevereiro de 1974.